segunda-feira, 6 de outubro de 2014

O Livro da Vida

Muito já se ouviu falar sobre o Livro da Vida, mencionado por diversas vezes no livro de Apocalipse. Entretanto, a sua definição tem dividido muitas denominações cristãs, principalmente pelo fato ser algo que interfere no pensamento sobre a soteriologia (o estudo da salvação). Dessa forma é importante entendermos, baseado nas evidências bíblicas, qual o significado real deste Livro e quais as implicações para a vida humana, em se tratando de está ou não inscrito nele. Queremos responder perguntas como: "Por que é importante compreendermos o propósito deste Livro?", "Algum nome pode ser apagado deste livro?", "Quando este Livro começou a existir?", etc.

Antes de tudo é importante deixar claro que o Livro da Vida não é uma referência a Bíblia, como alguns pensam. É óbvio que a Palavra de Deus testifica a respeito da vida e ela mesma contém as palavras de vida eterna (Jo 6:68), mas não podemos fazer uma referência imediata a Palavra de Deus quando encontramos versículos a respeito do Livro da Vida. Mais a frente vamos entender o porquê.

O grande interesse em se estudar acerca do Livro da Vida é porque a Bíblia nos mostra que ele será um instrumento para o julgamento final dos pecadores.  
"Vi também os mortos, os grandes e os pequenos, postos em pé diante do trono. Então, se abriram livros. Ainda outro livro, o Livro da Vida, foi aberto. E os mortos foram julgados, segundo as suas obras, conforme o que se achava escrito nos livros" Ap 20:12. 
Esse evento é conhecido como "o grande trono branco" (Ap 20:11), onde aqueles que foram mortos sem Cristo serão julgados e condenados diante de Deus. É interessante que eles já estão condenados (Jo 3:18), mas irão passar por um julgamento para que eles mesmos reconheçam que não merecem o perdão de Deus por terem negado, enquanto em vida, o sacrifício de Cristo. Dessa forma, o Livro da Vida será um dos critérios que evidenciarão a condenação deles.  
"E, se alguém não foi achado inscrito no Livro da Vida, esse foi lançado para dentro do lago de fogo" (Ap 20:15). 
O "lago de fogo" é o lugar de tormento eterno, onde Satanás e todos os que estão sem Cristo irão sofrer eternamente. Muitos pensam que o Diabo será o governador do submundo, mas ele já está condenado a ser atormentado pelos séculos dos séculos no lago de fogo (Ap 20:10). Por isso, é importante ter o nome escrito no Livro da Vida, pois a ausência nele implica em uma condenação e separação eterna diante de Deus. Então, é completamente relevante a compreensão da verdade sobre esse Livro, pois as implicações acerca da doutrina da salvação estão completamente relacionadas. Dessa forma, é importante fazer a seguinte pergunta:  Mas quais são as pessoas que possuem seu nome nesse Livro?

Era muito comum em culturas antigas - assim como em Israel - existir um registro de todos os cidadãos daquele local. Isso era uma prova de cidadania. Entretanto, esses nomes poderiam ser apagados por situações adversas, como morte, por exemplo. A Bíblia nos mostra que Deus faz de forma semelhante com os "cidadãos celestiais". O Livro da Vida registra todos aqueles que habitarão juntamente com o Senhor no paraíso. O Velho Testamento já mostra alguns indícios acerca desse Livro:
"Agora, pois, perdoa-lhe o pecado; ou, se não, risca-me, peço-te, do livro que escreveste" (Êx 32:32).
 Neste trecho, Israel havia pecado contra Deus, construindo para si um bezerro de ouro com a intenção de adorá-lo, e Moisés intervém em favor do seu povo para que Deus lhes perdoasse esse pecado. E nesta ocasião, Moisés roga a Deus que, caso o pecado de Israel fosse imperdoável, o seu nome fosse retirado do "livro que escreveste" (uma referência ao Livro da Vida, creio). Observe, a seguir, outro versículo:

"Sejam riscados do Livro dos Vivos e não tenham registro com os justo" (Sl 69:28). 
Neste Salmo, Davi pede a morte de seus inimigos, pedindo a Deus que os retire do Livro dos Vivos (mais uma referência ao Livro da Vida). Dessa forma, podemos aprender algumas coisas: (1) Deus é a única pessoa que pode escrever nesse Livro; (2) os nomes que nele estão contidos podem ser riscados; e (3) aparentemente, todas as pessoas que estão vivas possuem seus nomes inscritos, sendo a morte física um meio de riscá-lo. É dessa forma que o VT apresenta o Livro da Vida. Então quer dizer que somente as pessoas que se encontrarem vivas - ou seja, que possuem seus nomes no Livro da Vida - no dia do juízo é que escaparão da condenação eterna? Não existe nenhum meio de ter o nome gravado permanentemente, mesmo após a morte?

O Novo Testamento apresenta uma visão um pouco mais restrita acerca desse Livro. Todas as vezes que a expressão aparece é em Apocalipse, exceto em Fp 4:3:  
"A ti, fiel companheiro de jugo, também peço que as auxilies, pois juntas também se esforçaram comigo no evangelho, também com Clemente e todos os demais cooperadores meus, cujos nomes se encontram no Livro da Vida". 
Aqui o apóstolo Paulo se refere a pessoas que trabalhavam fielmente na obra de Deus. Seria um tanto inusitado se o apóstolo tivesse usado a expressão "Livro da Vida" apenas para enfatizar que esses cooperadores ainda estavam vivos naquele tempo. Talvez fosse mais óbvio justificar o uso da expressão para deixar claro que essas pessoas eram crentes, salvas em Cristo Jesus. Se esse texto não deixa claro a relação entre ser salvo e ter o nome gravado no Livro da Vida, observe os textos a seguir:  
"O vencedor será vestido de vestiduras brancas, e de modo nenhum apagarei o seu nome do Livro da Vida" Ap 3:5 
"E aqueles que habitam sobre a terra, cujos nomes não foram escritos no Livro da Vida desde a fundação do mundo, se admirarão vendo a besta que era e não é, mas aparecerá" Ap 17:8
  No primeiro verso, o Senhor Jesus mostra ao apóstolo João uma forma de ter o nome escrito permanentemente no Livro, que é vencendo através de Cristo (Rm 8:37). Aqueles que estão em Cristo não podem ter seus nomes riscados, nem mesmo através da morte! Isso porque, de acordo com o segundo versículo, os nomes dos eleitos do Senhor foram escritos antes da fundação do mundo! Antes de ter vida, o nome dos salvos já estavam escritos no Livro da Vida e, dessa forma, não podem ser apagados! Muitas pessoas que se dizem salvas creem que o pecado é capaz de riscar o nome delas do Livro e que serão condenadas se não apresentarem-se diante de Deus completamente imaculadas. Sabemos que o pecado sempre vai existir (I Jo 1:8) e o texto de Ap 3:5 nos dá a garantia de que estaremos livres da condenação eterna.

De acordo com os textos apresentados, podemos entender um pouco mais sobre o Livro da Vida. Em alguma hora, todas as pessoas irão morrer e terão seus nomes riscados deste Livro. A única forma de garantir a permanência nesse Livro é sendo um "vencedor" através do sacrifício perfeito de Cristo.

E você? Pode ter certeza que seu nome nunca será apagado?

sábado, 30 de agosto de 2014

Jesus Cristo: apenas um exemplo a ser seguido?

"Sede meus imitadores, como também eu sou de Cristo." I Coríntios 11:1
Paulo não está sendo orgulhoso - como alguns pensam - quando referiu essas palavras. Ele estava ensinando os irmãos de Corinto a manterem um comportamento cristão em meio a sociedade pagã e imoral em que viviam. Com certeza, quase que a totalidade deles nunca viram pessoalmente a Cristo e pouco ouviram acerca de seus ensinos. O apóstolo, de forma resumida e direta, exorta aqueles irmãos a terem como parâmetro de imitação a vida de Paulo, que obviamente foi um reflexo do que Cristo pregou e fez aqui na terra, além do fato de o terem conhecido pessoalmente. Mas será que Cristo é somente um bom exemplo, que vale a pena ser imitado? Será que ele simplesmente foi um homem com bons valores morais e sociais e que lutou, até a morte, para que seus princípios fossem praticados? Será que ele foi somente um pensador revolucionário que criou uma religião chamada cristianismo?

Paulo escreveu esse versículo em uma carta endereçada a uma igreja que havia na cidade de Corinto. O público alvo desta mensagem era pessoas que já professaram publicamente a fé em Cristo; que realmente criam nele como salvador de suas vidas. A essa altura da história (55 d.C.), as boas novas de Cristo já haviam sido espalhadas pelo mundo do primeiro século. Um dos meios pelo qual o mundo soube da vida de Jesus foi através do próprio apóstolo Paulo, em suas muitas viagens. Ele, inclusive, levou o evangelho para a cidade de Corinto. Uma das formas que o apóstolo encontrou de continuar ensinado, exortando e esclarecendo os assuntos referentes a vida cristã, foi por meio de cartas - que compõem boa parte do nosso Novo Testamento. E nesse caráter exortativo, o conteúdo da mensagem que essas cartas carregavam era a recomendação de um padrão de vida semelhante ao de Cristo (Ef 4:1; 5:1; 6:1-5; Fp 1:27; 2:5). Essa é a vontade de Deus: que seus filhos vivam como o seu Filho! Dessa forma, só há sentido em imitar Jesus para aqueles que realmente o tem como Salvador de suas vidas. Esse processo de imitação é chamado de santificação!

Entretanto, mesmo pessoas que não depositam inteiramente sua fé em Cristo reconhecem que ele foi um homem de caráter  e continua sendo um exemplo mundial para ser seguido. As suas atitudes e os seus ensinamentos devem ter um espaço na educação humana sobre ética e responsabilidade social. Ele sustentou as suas teses e, mesmo sofrendo pressão religiosa e política por parte dos judeus e do governo romano, não negou a sua personalidade, preferindo morrer do que ver sua ideologia morta. Seu pensamento movimentou uma multidão de pessoas que, acima de tudo, lutavam pelos direitos dos pobres e pela inclusão dos marginalizados. É assim que o mundo ver a Cristo. Será que "seguir o exemplo de Cristo" é a solução para a humanidade? Vou melhorar a minha pergunta: será que pessoas que não depositaram sua fé no sacrifício de Cristo podem ser transformadas somente por seguir o exemplo de Jesus? A ênfase para a salvação do pecador deve ser no sacrifício de Cristo ou em sua vida terrena como um revolucionário? Apesar de muito do que foi citado no início desse parágrafo ser verdadeiro, há um perigo mortal em confiar na restauração da humanidade sendo pragmático sobre o exemplo de Jesus.

Primeiro, não há como seguir os passos de Cristo se você não estiver em Cristo. Ou seja, só é possível imitar a Jesus se você o reconhece como o Salvador de sua vida. Veja o verso abaixo:
"Aquele que diz que permanece nele [em Cristo], esse deve andar assim como ele andou." I Jo 2:6
É nisto em que está baseado a salvação, segundo a Bíblia. O homem é transformado quando crê na morte substitucional e na ressurreição sobrenatural de Cristo. Deus não cobra que se atinja um patamar de bondade para que isso aconteça (Rm 4:5). Basta depositar sua fé completamente na pessoa de Jesus. É algo instantâneo, e não progressivo (At 16:31). Seguir os passos de Jesus seria uma consequência e uma evidência de que esse primeiro passo [de fé] já foi dado. Portanto, seguir o exemplo de Cristo, esquecendo-se de crê nele, é um caminho sem êxito diante de Deus.

Segundo, temos que entender o que significa conversão. A Bíblia nos diz que o salário do pecado é a morte (Rm 6:23), ou seja, quem peca contra Deus deve morrer para que a Sua justiça seja satisfeita. Dessa forma, o máximo que um viver "piedoso" - segundo os passos sofridos de Cristo - pode fazer é consertar a sua situação do presente e do futuro, mas seus pecado do passado estão em débito para com Deus. Você precisa pagá-los. "Sem derramamento de sangue não há remissão" (Hb 9:22). A grande beleza do evangelho é que Deus aceita um substituto para pagar pelos seus pecados. Foi assim que aconteceu com Israel, durante o regime da Lei. Deus providenciou os sacrifícios levíticos para que os pecados da nação fossem pagos. O israelita deveria levar um animal sem defeito para o altar, colocar sua mão sobre a cabeça dele (simbolizando a transferência da culpa pelo pecado) e o sacrificar, satisfazendo a justiça de Deus. A questão é que "o animal morria, mas não como um exemplo de como o pecador deve, em troca, sofrer pelos seus próprios pecados e, desse modo, encontrar perdão; ele morria como um substituto no lugar do pecador, para que o pecador não tivesse que sofrer ele próprio a pena do seu pecado e morrer" (LENNOX, 2014). Esses sacrifícios levíticos eram um símbolo do sacrifício perfeito que viria mais tarde na pessoa de Cristo. Da mesma forma, a morte de Jesus não representa um legado de sofrimento que cada um deve experimentar para conseguir de Deus o perdão, mas sim o perfeito sacrifício, onde todo que deposita inteiramente a sua fé nele, experimenta o perdão do Pai. E a realidade da situação é essa: "até que os homens e as mulheres sejam convertidos, eles não terão nem o poder nem a disposição de seguir o exemplo de sofrimento de Cristo" (LENNOX, 2014).

A diferença é minuciosa, mas é fatal. Enquanto você encarar Cristo como simplesmente um grande homem na história, o seu problema não está resolvido. Me entristeço quando vejo as pessoas enaltecendo Cristo dessa forma. Eles colocam Jesus no topo das personalidades mundiais, mas não fazem ideia do que ele realmente representa. Ele é a intervenção divina para a salvação do homem, e não um homem politicamente correto! Ele não somente morreu, mas ressuscitou!


LENNOX, John & GOODING, David. A Definição do Cristianismo. Editora A Verdade, Porto Alegre, 2014.

sábado, 19 de julho de 2014

A Lógica da Salvação pelas Obras

A carta de Paulo aos Romanos é um dos textos bíblicos que melhor desenvolve a tese acerca da doutrina da salvação. Na verdade, a intenção do apóstolo é ensinar a igreja em Roma a única forma que o homem pode agradar a Deus, e o meio para isso é através do evangelho (Rm 1:16). É óbvio que esse caminho não é nada fácil, até porque os primeiros passos nessa caminhada envolvem um reconhecimento pessoal de que você
não é capaz de caminhar sozinho. O homem está perdido completamente em seus pecados e não teria condições nenhuma de se chegar a Deus. É nesse contexto em que Paulo, inspirado pelo Espírito Santo, disserta acerca da necessidade da salvação. Talvez um pensamento errado acerca desse assunto por parte dos irmãos em Roma estimulou o apóstolo a escrever sobre isso. A questão é que o maior desafio de qualquer pregador é convencer o pecador de que ele realmente necessita de um meio [fora de si mesmo] para ser salvo. Apenas a fé na redenção gratuita que há em Cristo Jesus (Rm 3:24) é capaz de aplacar a ira de Deus (Rm 1:18) que estava sobre nós, satisfazendo a sua justiça (Rm 3:25).

Entretanto, a salvação quase que sempre foi tida como algo meritório, tanto entre os gentios como também entre os judeus. Ou seja, a salvação como um prêmio merecido pelo tamanho esforço. É até admissível esperar esse tipo de pensamento por parte dos gentios, pois, afinal de contas, eles não tinham nenhuma revelação da vontade de Deus, exceto pelo testemunho da nação de Israel. Mas os judeus não deveriam sustentar essa ideia, pois eles tinham os "oráculos de Deus" (Rm 3:2). Os patriarcas, os profetas, as alianças, tudo foi confiado a nação de Israel, que tinha obrigação de conhecer verdadeiramente os planos de Deus. Porém o passar dos anos fizeram com que os judeus esquecessem os preceitos e ensinos do SENHOR, depositando uma confiança muito grande na própria carne, por possuir o sangue do povo escolhido de Deus. O judeu sentia-se seguro simplesmente por ser cuidadoso em observar as obras de justiça [dar esmolas, viver "piedosamente"] e as obras da lei [esforço em cumprir toda a lei mosaica]. Paulo quer acabar tanto com a ignorância dos gentios, como a ingenuidade dos judeus, lançando um pensamento lógico acerca da salvação pelas obras. Vemos isso em Rm 4:2.
"Porque, se Abraão foi justificado por obras, tem de que se gloriar, porém não diante de Deus" Romanos 4:2
Aqui o apóstolo cita o exemplo de Abraão, o pai dos judeus. Se os judeus tinham respeito por alguma pessoa, com certeza essa pessoa seria Abraão. Paulo, então, usa dessa situação para enriquecer o seu argumento acerca da salvação pela fé. Entretanto, gostaria primeiro de voltar a atenção para o verso citado acima. Vamos primeiro tentar esquecer de Abraão por um instante e vamos imaginar que esse versículo mostra uma relação teísta entre um homem e sua divindade. Toda lógica teísta vai envolver pelo menos dois seres, onde um deles é um ser superior [uma divindade] e o outro é um ser inferior [o homem]. O que Paulo está sugerindo primeiramente é o seguinte: "Se o ser inferior pode ser capaz de salvar a si mesmo, ele tem todo direito de se gloriar". Ora, se você conseguiu livrar a sua vida da condenação por seus próprios esforços, é óbvio que a glória e o mérito estão totalmente em suas mãos! Você poderia olhar para as outras pessoas não-salvas e dizer: "Eu consegui! Fui bom o suficiente para merecer a salvação!", e seria algo completamente normal, porque foi algo que você mesmo construiu.

Mas, espere aí! Vocês não estão esquecendo nada? Exatamente, não devemos esquecer a relação entre o ser inferior e o superior; entre o homem e a divindade. Paulo, então, argumenta da seguinte forma: "Se a salvação do homem fosse realmente por obras, a sua glória seria completamente absurda diante do ser divino". Que cena bizarra seria o homem gloriando-se diante de sua divindade por ter escapado da condenação que estava sobre ele! O homem deve gloriar-se por alcançar a sua própria salvação [isso é algo lógico], mas quando o assunto é entre ele e o ser superior, o "gloriar-se" torna-se completamente ilógico. O que Paulo está querendo dizer nesse verso é que a lógica teísta não dá espaço para uma salvação por obras, pois isso traria a glória inteiramente ao homem e o exaltaria diante da sua divindade.

É óbvio que Paulo nomeia o ser inferior e o superior. Estamos falando de Abraão e o único Deus, o Todo Poderoso. No restante do texto, vemos que Abraão não foi salvo por suas obras; mas na verdade a fé na promessa que Deus lhe havia feito sobre o seu descendente ["e o descendente era Cristo" (Gl 3:16)] foi que lhe garantiu a salvação. Não depende de nosso trabalho ou esforço, "mas ao que não trabalha, porém crê naquele [Jesus Cristo] que justifica o ímpio, a sua fé lhe é atribuída como justiça" (Rm 4:5).

terça-feira, 27 de maio de 2014

A Graça de Deus Sobre a Perversão

Certa vez, em um sermão sobre a depravação do homem, um pregador falou sobre a maldade tão evidente do totalitário alemão, Hitler. Isso me motivou a estudar e a escrever um pouco sobre esse assunto descrito no título deste artigo.

É interessante como as pessoas tornam-se imortais pelos seus feitos aqui na Terra. Isaac Newton, Mozart, Leonardo da Vinci, Freud, todos eles foram homens que deram grandes contribuições para a ciência, a música e a arte, e estão vivos até hoje em nossas literaturas. Hitler, porém, ficou marcado na história pelos massacres e homicídios que realizou durante a Segunda Guerra Mundial. Praticamente a personificação da maldade, a ponto de virar até um parâmetro de comparação entre as atrocidades que vemos hoje em dia. Assim como é difícil encontrar novos "newtons" ou "mozarts", também acredito que não é em qualquer esquina que encontraremos homens como Hitler, não é mesmo? Será? A Bíblia nos fala que o homem é intrinsecamente mal, e que não há boas intenções em seu coração. "Todos se extraviaram, à uma se fizeram inúteis; não há quem faça o bem, não há um sequer." (Rm 3:12). Entretanto, nem todos saem por aí matando milhares de pessoas sem nenhuma razão sã, convencendo outras milhões de pessoas de que ele está certo sobre isso. É bastante óbvio para todos que existem pessoas que são aparentemente mais más do que outras. Não precisa fazer nenhum estudo para ter certeza sobre isso; basta ligar a televisão em reportagens policiais para concluir que você não seria capaz de fazer a mesma coisa que aquele assassino e estuprador fez com seus próprios filhos. Até mesmo pessoas que não conhecem a Deus tem um bom senso moral sobre esse assunto. A questão é a seguinte: como conciliar o ensino bíblico sobre a natureza completamente depravada do homem que não conhece a Deus, com os diferentes níveis de maldade que vemos em nossa sociedade? Ou seja, por que existem pessoas menos más do que outras, se o homem é totalmente mal? Adiantando a resposta, isso também é fruto da graça de Deus! Mas vamos ver o que a Bíblia nos fala a respeito disso!

No Cap1 de Romanos, Paulo descreve a triste situação depravada do homem. Vemos que o homem "repousa" sobre a ira de Deus, porque, mesmo tendo condições suficientes para perceber a existência de Deus [pois o próprio Deus Se revela através das coisas que foram por Ele criadas], não Lhe dão o devido louvor; pelo contrário, eles julgam ser sábios o suficiente para excluírem a necessidade da dependência de Deus. "Inculcando-se por sábios, tornaram-se loucos" (Rm 1:22). E essa não é somente uma condenação àqueles que se intitulam ateus, mas também a todos que não creem na pessoa de Jesus Cristo - a manifestação da glória de Deus (Jo 1:14). Não há como glorificar a Deus, senão através do Senhor Jesus. Desta forma, todos os homens [inclusive eu e você], em algum momento da vida, estiveram [ou estão] nessa situação de condenação diante do SENHOR.

Entretanto, a minha ênfase está no texto seguinte, a partir do verso 24, onde Paulo descreve a situação moral daqueles que não honram a Deus. "Por isso, Deus entregou tais homens à imundícia (...)" (Rm 1:24, grifo meu). O restante do texto também nos diz que Deus entregou esses homens a paixões infames (v. 26) e a uma disposição mental reprovável (v. 28). Vamos procurar, então, estudar um pouco sobre a palavra "entregou", presente nos três versículos destacados acima. Segundo Coenen et al. (2000, vol. 1, p. 646-649), a palavra entregou tem origem na expressão grega παραδιδωμι (paradidomi), que, no uso clássico, tem a ideia de "passar adiante", "entregar", "render", "transmitir", entre outros. Em quase todas as ocasiões que o apóstolo Paulo usa essa palavra, ele expressa uma ideia de "transmissão de uma doutrina ou tradição". É como se Paulo estivesse tentando dizer que Deus simplesmente "transmite" aquilo que parecia ser "tradicional" na vida do ímpio; ou seja, por haverem pecado contra Deus, Ele permite que esse homens continuem pecando. Deus paga o pecado com pecado. Agora, tenham muito cuidado ao lerem essas frases! Em nenhum momento eu disse que Deus era a fonte do pecado; ou que Deus é o agente para a existência do pecado. De forma nenhuma! Deus simplesmente não intervém de forma plena no desejo humano de pecar; Ele repassa aquilo que os homens haviam feito, a princípio, quando trocaram a glória de Deus pela sua própria. Enquanto o homem negar o louvor devido a Deus, ele será entregue a paixões e a uma mente cauterizada.

Tendo isso em mente, vamos voltar nossa atenção a descrição de Paulo quanto ao comportamento imoral evidenciado naqueles homens que não honram a Deus. Dentre a idolatria (Rm 1:25) e o homossexualismo (Rm 1:26, 27), tem-se a lista a seguir:
"Cheios de toda injustiça, malícia, avareza e maldade; possuídos de inveja, homicídio, contenda dolo e malignidade; sendo difamadores, caluniadores, aborrecidos de Deus, inventores de males, desobedientes aos pais, insensatos, pérfidos, sem afeição natural e sem misericórdia." Romanos 1:29-32
 Uma lista bem grande. Essa é a condenação terrena dos que não depositam sua fé em Cristo. Tenho certeza que, para alguns, isso parece mais dádiva do que castigo; mas pode apostar que é um tremendo de um castigo!

Desta forma, conhecendo o perfil daqueles que insistem em negar o louvor devido a Deus, surge o seguinte pensamento: "Ok, Paulo descreve a situação imoral daqueles que negam a Deus, mas nem todas essas pessoas apresentam esse comportamento lamentável. Isto é, nem todas são homossexuais, ou homicidas, ou difamadoras, ou malignas, etc. Como explicar isso?" Só há uma forma de explicar isso, e é através do Ser que dosa a consequência do pecado. Que entrega o homem a pecados maiores devido a sua incredulidade; e esse ser é o próprio Deus! Ele não intervém plenamente no pecado, como falamos anteriormente, mas é óbvio que existe algum nível de intervenção divina para que toda a humanidade não seja um caos total. Mas será que isso é por conta de algum tipo de merecimento humano, onde Deus olha a "boa intenção" do homem e, por isso, não permite que ele seja mal? Não! Isso é fruto de Seu grande atributo, chamado GRAÇA. A graça não está presente somente na salvação do pecador, mas também em refrear a maldade do ímpio. O próprio Deus é quem diminui a maldade no coração do homem de acordo com a Sua soberana vontade e não mediante atitudes humanas. Se não fosse a graça de Deus agindo dessa forma, toda a humanidade tinha o comportamento imoral descrito por Paulo em Romanos 1. Agora, a manifestação da graça de Deus nesse aspecto não produz o mesmo resultado com relação a salvação! É importante deixar isso bem claro. De alguma forma, a graça de Deus está sobre a vida do ímpio e do justo, entretanto, no primeiro caso, ela atua para refrear maldade do homem, e no segundo caso, para dar a salvação ao homem.

Sabendo de tudo isso, você ainda acha que Hitler foi uma pessoa extraordinária, no sentido de que ele foi uma exceção ao comportamento humano? Não! Na verdade Hitler é um exemplo de como o homem realmente é em seu interior. É simplesmente a essência do ser humano, a prova de que o homem sem Deus está completamente perdido.

sábado, 5 de abril de 2014

"A Guerra pela Verdade"

Inaugurando uma nova série de posts sobre resenha de livros, gostaria de comentar sobre o livro A Guerra pela Verdade, John MacArthur.

Sobre o autor
Autor de mais de 150 livros, muitos dos quais são best-sellers, e alguns deles publicados no Brasil, pela Editora Fiel. É pastor da Grace Community Church, em Sun Valley, Califórnia. É presidente da Master's College and Seminary e do Ministério "Grace to You". Esse Ministério desenvolve e transmite para diversos países um programa de Rádio que tem esse mesmo nome; também produz grande quantidade de materiais, impressos, em áudio e para a internet. John e sua esposa Patrícia tem quatro filhos e catorze netos.

(Mais informações: http://pt.wikipedia.org/wiki/John_Fullerton_MacArthur)

Sobre o Livro
O livro trata de um grande encorajamento aos cristãos para defenderem a sua fé em meio a uma sociedade marcada pela permissividade e pensamentos relativistas sobre a certeza, usando como base as verdades bíblicas. É óbvio que, em meio às exortações e encorajamentos, vemos: relatos sobre as grandes heresias que permearam a igreja durante os primeiros séculos; históricos de grandes homens que lutaram pela verdade; os pensamentos moderno e pós-moderno a respeito da verdade; as igrejas atuais que negam as Escrituras como uma fonte infalível de princípios divinos; doutrinas referentes às verdades bíblicas; entre outros. Basicamente, esse livro traz boas interpretações e aplicações atuais [e históricas] do livro de Judas, que enfatiza o dever do cristão em lutar pela verdade e combater os falsos mestres que adentravam nas
igrejas naquela época.
Então, se você deseja aprender um pouco mais sobre qualquer um desses temas, esse é um ótimo livro. A leitura não é tão fácil, até pela complexidade do assunto. É um livro que merece ser estudado, e não apenas lido. Os temas abordados não são de natureza comum às leituras devocionais que temos muitas vezes, mas sim uma crítica sobre pensamentos que permearam a história com o objetivo de anular a confiança nas verdades bíblicas. Dá pra perceber que o autor estudou bastante sobre esse tema, inclusive em literaturas não cristãs.

Sobre os Capítulos
O texto é dividido em 8 capítulos, mais uma introdução e um apêndice. Vou apenas comentar um pouco sobre os temas dos capítulos, juro que não vou estragar a surpresa!

Na Introdução, ele faz um grande resumo sobre o tema do livro, enfatizando o motivo pelo qual devemos lutar pela verdade.Vemos sobre o que é verdade e como esse conceito está ligado diretamente a natureza de Deus. A atenção do cristão sobre esse assunto deve ser relevante, pois existem igrejas na atualidade que tem crescido com esse pensamento relativista sobre a verdade.
No Capítulo 1, vemos um grande estudo sobre o comportamento humano em se relacionar com a verdade através das eras moderna e pós-moderna e como isso afetou, inclusive, o cristianismo (Ótimo capítulo).
Nos Capítulos 2 e 3, o autor enfatiza a existência de uma guerra que devemos travar contra esses pensamentos pós-modernos, para que a saúde da igreja permaneça. Ele condena qualquer comportamento de acomodação diante da apostasia que claramente se multiplica no meio evangélico.
Nos Capítulo 4, 5 e 6, ele dedica um bom tempo para falar sobre a apostasia e sobre heresias que surgiram desde o primeiro século e atacam as igrejas hoje em dia. Possui várias definições de seitas e como elas evoluíram ao longo do tempo.
No Capítulo 7, vemos exemplos de igrejas que abandonaram o compromisso com a verdade, anulando o senhorio de Cristo, e passaram a tratar o culto como um simples entretenimento. Fala muito sobre as "Igrejas Emergentes" e os seus líderes, que negam a Cristo como o cabeça da Igreja.
No Capítulo 8, ele dá uma boa exposição de Judas 5 e motiva os leitores a lembrar-se das lições do passado para construir grandes homens de Deus no futuro.

Onde Comprar
Livraria Erdos
Editora Fiel


MACARTHUR, John. A Guerra pela Verdade: Lutando por certeza numa época de Engano, São José dos Campos, SP: Editora Fiel.


quarta-feira, 2 de abril de 2014

A Importância de um Líder

"E se ajuntaram contra Moisés e contra Arão e lhes disseram: Basta! Pois que toda a congregação é santa, cada um deles é santo, e o SENHOR está no meio deles; pois por que vos exaltais sobre a congregação do SENHOR?" Números 16:3
     Ao ler esse texto, e também todo o capítulo 16 de Números, me vem a mente pelo menos dois grupos de pessoas. Primeiro, aqueles que negam completamente a autoridade do líder sob o qual estão subordinados. Em nosso contexto eclesiástico, seriam aquelas pessoas que não conseguem, por algum motivo, reconhecer a autoridade do pastor e dos líderes da igreja. Eles simplesmente fazem o que querem e usam o pretexto "meu líder é Deus" para não sujeitar-se a autoridade pastoral. Geralmente, essas pessoas apresentam esse tipo de comportamento por acharem-se esclarecidos ao ponto de não precisarem de um guia espiritual em sua caminhada cristã; eles que, na verdade, deveriam exortar e auxiliar os líderes a caminharem dentro dos padrões divinos, por serem tão sábios [perdão pelo sarcasmo]! O segundo grupo, são aqueles que negam a necessidade de um líder espiritual sobre as suas vidas. E pode apostar que eles também não gostam muito do conceito de Igreja! Eles entram com argumentos sobre a possibilidade de adorar a Deus em qualquer lugar e sobre a péssima saúde da grande maioria das igrejas evangélicas no nosso país, e que, por isso, preferem realizar reuniões informais e fora dos padrões tradicionais de um culto público. Sem líderes e sem organização litúrgica; cada um faz o que bem entender. Excluem completamente a figura da liderança, tão enfatizada nas Escrituras.
     A ocasião do verso apresentado acima encontra-se no contexto da peregrinação de Israel no deserto, marchando do monte Sinai até Cades-Barnéia, sob a liderança de Moisés e Arão. O próprio Deus havia separado esses homens para realizar a obra de libertar o povo das mãos ímpias do Egito. E com certeza, esse chamado foi, por repetidas vezes, resistido; pelo menos por parte de Moisés (Êx 4). Isso enfatiza o fato que Moisés nunca buscou ser o líder do povo, porém o próprio Deus o designou e o capacitou para esta obra. Em Êxodo 4:16, o SENHOR disse a Moisés: "tu lhe serás por Deus", referindo-se sobre o seu ministério em revelar a Arão a palavra de Deus. Paulo também trata Moisés como um mediador entre Deus e os homens (Gl 3:19). Que responsabilidade de Moisés! A Arão, coube a responsabilidade de interceder pelo povo. Ele e sua descendência foram separados por Deus para oficiarem como sacerdotes, e isso seria por "estatuto perpétuo para ele e para sua posteridade" (Êx 28:43). Dois grandes líderes, sendo guiados pelo nosso único Líder, Deus. A vontade humana não é suficiente para levantar líderes, mas somente Deus pode levantá-los!
     Entretanto, o esforço em cumprir o dever dado por Deus não era apreciado por parte do povo de Israel. Inclusive o alvo das murmurações era muitas vezes contra Moisés (Nm 14:2), sem saber eles que uma murmuração contra um líder de Deus era uma murmuração contra o próprio Deus (Nm 14:27). O ódio era tanto, que eles queriam apedrejá-lo (Nm 14:10)! Até mesmo Arão e Miriã, irmãos de Moisés, ficaram contra ele em algum momento (Nm 12:1, 2). Tudo isso era fruto da falta de compreensão e de consideração sobre o caráter vital do papel do líder na congregação. E entre todas essas insatisfações, vemos a rebelião de Corá, descrito no capítulo 16 de Números.
     Corá era um levita, filho de Coate (Nm 16:1). Ele com certeza era um homem muito importante dentre os filhos de Israel. O simples fato de ter a sua genealogia registrada nas Escrituras é prova disso (WIERSBE, 2006). Mas a sua importância e preeminência o exaltou a ponto de questionar a importância de Moisés sobre a nação de Israel (não é geralmente assim que acontece?). E esse é o primeiro aspecto de uma pessoa que deseja derrubar [em algum sentido] uma liderança. A autossuficiência intelectual clama por uma vida livre de regras ou subordinações, capaz até mesmo de desprezar uma figura completamente bíblica. Tenho certeza que Corá entendia a organização instituída por Deus para orientar o povo através do deserto, mas a sua ganância e soberba fez com que ele resistisse a ordem do SENHOR.
     O segundo aspecto vemos no verso 2: "Levantaram-se perante Moisés com duzentos e cinquenta homens". Uma rebelião não pode ser feita com único homem; não teria nenhuma força. Por ser coatita, Corá era responsável por carregar a mobília do tabernáculo quando Israel estava em marcha. Durante a marcha, os coatitas ficavam bem próximos de outras tribos dos filhos de Israel, mais especificamente de Gade, Simeão e Rúben. Isso talvez explique o fato de que a rebelião era composta por pessoas de outras tribos, não somente por levitas (WIERSBE, 2006). A questão é que pessoas como Corá sempre influenciam e convencem outras pessoas acerca do seu pensamento. Elas não se deleitam, pessoalmente, em suas filosofias singulares, mas fazem questão de mostrar aos outros como o seu pensamento faz sentido!
     No versículo 12, nós vemos o terceiro aspecto de alguém que rejeita a figura de um líder. Datã e Abirão (v.1, 12), que encabeçavam [juntamente com Corá] a rebelião, receberam uma ordem de Moisés de comparecerem a reunião para decidir algo sobre esses assuntos. E eles, de forma rebelde, disseram: "Não subiremos" (v.12). E além disso ainda culparam Moisés por terem os tirado da terra do Egito, supondo lá ser a terra que mana leite e mel! Indisciplinados, rebeldes. Eles não só recusam a liderança como a ridicularizam.
     Esse é o perfil daqueles que não suportam os padrões cristãos de liderança. Eles podem parecer dissimulados em um primeiro momento, mas não demorará muito para evidenciarem o desprezo pela organização divina da igreja. Isso com certeza se aplica aos dois grupos que mencionei no início deste post. Tanto aqueles que vivem dentro igreja rejeitando o pastor, como aqueles que estão fora da igreja rejeitando a organização litúrgica do culto, são rebeldes, "autossuficientes" e fazem questão de influenciar outras pessoas sobre o erro.
     Isso tudo porém, rendeu a Corá e sua equipe grande condenação por parte de Deus. Moisés propôs que o SENHOR fosse consultado para saber a resposta sobre o que eles estavam sugerindo, ou seja, a ausência de um líder. Talvez eles tivessem alguma esperança de que Deus estivesse do lado deles! A resposta de Deus foi de reprovação total, a ponto de matar todos aqueles que se mostraram rebeldes.
     Ao invés de ignorar, pense em como você poderia ser útil na obra de Deus, auxiliando o seu pastor.


WIERSBE, Warren W. Comentário Bíblico Expositivo: Antigo Testamento, Volume 1, Santo André, SP: Geográfica Editora, 2006

sábado, 8 de fevereiro de 2014

Quanto eu preciso saber da Bíblia para ser salvo?

"E que, desde a infância sabes as sagradas letras que podem tornar-te sábio para a salvação pela fé em Cristo Jesus." II Timóteo 3:15
     As pessoas têm muita dificuldade em aceitar a graça de Deus. O fato de ser salvo sem fazer nada é algo que incomoda muita gente. Isso se dá, provavelmente, devido ao mundo em que vivemos hoje, que cria seres humanos com uma disposição para dispensar qualquer tipo de favor. A conquista é algo que faz parte do ego do homem, e eliminar isso é quase que destruir a essência de seu viver. Temos essa necessidade de receber apenas aquilo que merecemos, por isso o favor torna-se humilhante demais para ser recebido.
     Se você acha que os cristãos estão completamente fora desse grupo, você está enganado. "Como é que é? Os crentes não creem na graça?!". Tenha calma, deixe-me explicar. É óbvio que nós, cristãos, cremos na graça de Deus e compreendemos que a nossa salvação não depende de nosso esforço. Quero falar sobre pensamentos e conclusões que muitas vezes nos acomete e que limita [por tão pouco que seja] a graça de Deus. Eu estou falando sobre o conhecimento das doutrinas bíblicas. Não somente isso, mas a evidência do conhecimento bíblico [ou melhor, a falta deste] em outros cristãos. Infelizmente - e digo isso com muito pesar - temos muitas pessoas nas igrejas que não conhecem quase nada das Escrituras. Não manejam bem a Palavra da Verdade (II Tm 2:15). Quando o pastor cita uma referência na pregação, não conseguem achar o texto bíblico. Sofonias ou Habacuque? Eles nem tentam! Esse tem sido o perfil da maioria das pessoas que frequentam as igrejas evangélicas.  
     "E o que é que tudo isso tem a ver com graça?". Muitas vezes esse perfil leigo de muitos cristãos me fez questionar e, muitas vezes, diminuir a graça de Deus no papel da salvação. Será que alguém é realmente salvo, mesmo não compreendendo muito bem as doutrinas sobre salvação, sobre a pessoa de Deus ou de Jesus Cristo? Quanto uma pessoa precisa saber da Bíblia para ser salva? O versículo no início deste artigo me ajudou a pensar um pouco melhor e responder algumas dúvidas sobre esse assunto.
     Antes de discutirmos sobre o versículo acima, é interessante falarmos sobre o conhecimento das verdades Bíblicas. Em I Co 1 e 2, vemos o apóstolo Paulo dando uma bela explanação sobre a revelação da sabedoria de Deus aos homens. Ele nos diz que o mundo não pode conhecer a Deus pelos seus próprios meios (I Co 1:21) e que a mensagem do evangelho é loucura para eles (I Co 1:18). O conhecimento de Deus vem através de "Cristo, poder de Deus e sabedoria de Deus" (I Co 1:24) e Ele revela a Sua vontade através do Espírito Santo (I Co 2:10). Dessa forma, podemos concluir que as verdades bíblicas só podem ser verdadeiramente conhecidas através do Espírito Santo - e sabemos que esse Espírito habita somente naqueles que estão em Cristo.
     Agora, vamos voltar a nossa atenção para o versículo de II Tm 3:15, que está no topo deste artigo. Paulo fala a Timóteo sobre uma sabedoria para a salvação (observem o grifo do verso). Parece que o apóstolo está falando que existe um nível de conhecimento bíblico necessário que uma pessoa deve atingir para ser salva. Uma palavra chave para entendermos o verdadeiro sentido deste verso é a preposição "para". No português essa preposição pode assumir o papel de um adjunto adverbial, que indica uma finalidade ou propósito. Por exemplo: "Estou na escola para estudar", que representa a finalidade de estar na escola. Entretanto, quando analisamos o versículo no grego, a preposição "para" (εις) não indica uma finalidade. Ela é simplesmente uma preposição simples, usada apenas para ligar as palavras em uma oração. Qual a implicação disso? Quer dizer que o conhecimento e a sabedoria que podemos adquirir através das "sagradas letras" não tem a finalidade ou propósito principal de nos salvar, isto é, o conhecimento bíblico em si não traz a salvação. Podemos encontrar a salvação através da Palavra de Deus, mas o conhecimento [ou a falta deste] que temos das Escrituras não deve ser observado de forma absoluta como uma evidência da nossa salvação.
     É óbvio que a Bíblia apresenta o caminho da salvação. Pedro disse: "Senhor, tu tens as palavras da vida eterna" (Jo 6:68); vemos também que o caminho a Deus é somente através de Cristo, o Verbo (a Palavra). A Bíblia contém informações suficientes para que uma alma perdida tenha esperança de viver eternamente. É claro que é necessário que o pecador tenha conhecimento e compreenda (intelectualmente e espiritualmente) a sua condição miserável diante de Deus. Porém a salvação, manifestada pela graça de Deus, deve regida apenas pela fé em Cristo, seguida de um sincero arrependimento dos pecados. A graça torna-se limitada se condicionamos a sua ação salvadora no homem apenas ao atingir um determinado nível intelectual das Escrituras - e quando eu falo de nível intelectual das Escrituras, me refiro as doutrina elementares do cristianismo.
     Entretanto, a salvação não é motivo para relaxarmos no estudo bíblico. Vemos várias instruções na própria Bíblia sobre crescer no conhecimento de Deus. O autor de Hebreus nos diz, inclusive, que devemos nos aprofundar no estudo da Palavra:
"Por isso, pondo de lado os princípios elementares da doutrina de Cristo, deixemo-nos levar para o que é perfeito [completo, maduro](...)" Hebreus 6:1
Esquecer um pouco aqueles conceitos mais elementares do cristianismo (leite) e procurar destrinchar as verdades difíceis (Hb 5:11) da Bíblia e que parecem ocultas aos nossos olhos.
     A questão é que não podemos julgar a salvação de uma pessoa analisando somente o conteúdo bíblico que ela domina. "Porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isso não vem de vós; é dom de Deus" (Ef 2:8).
     Ah, e respondendo a pergunta que dá título a esse artigo, acredito que João 3:16 é suficiente!

quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

"O Meu Evangelho"

"Lembra-te de Jesus Cristo, ressuscitado de entre os mortos, descendente de Davi, segundo o MEU evangelho" II Timóteo 2:8
Essas são palavras do apóstolo Paulo ao jovem pastor Timóteo. Nesse verso, ele o encoraja a lutar pela fé cristã, recebendo a motivação através da memória do sacrifício de Cristo e das promessas feitas sobre Ele. Entretanto, o que me chamou mais atenção nesse texto foi a forma como Paulo tratou o evangelho. Ele disse o MEU evangelho! Confesso que fiquei um pouco confuso, pois em outras cartas, vemos Paulo anunciando a procedência divina de todas as coisas. Paulo diz que a igreja é de Deus (I Co 1:2), e não dele, mesmo sabendo que ele próprio havia fundado a igreja em Corinto. Também nos diz que o seu apostolado é fruto da obra de Deus (Ef 1:1), e não de suas próprias forças. Ele, inclusive, fala em outra passagem, que o evangelho anunciado por ele não vem de homem algum [nem mesmo dele], mas de Jesus Cristo (Gl 1:11, 12)!

Assim que li esse verso, corri para o Dicionário do Novo Testamento e para outras versões da Bíblia para ver se existia alguma outra tradução. E para minha decepção (brincadeira), não tinha. Era realmente isso. A palavra μου é um pronome que só pode ser traduzido como "meu", "minha", "de mim". "O meu (μου) evangelho", foi isso que Paulo disse.

Acho que uma interpretação bastante óbvia seria a associação que Paulo fez entre o conteúdo de sua mensagem com a própria pregação em si. Seria o equivalente a associar uma marca ao produto. Exemplos sobre isso não me faltam a cabeça! Falar "Bombril", ao invés de esponja de aço; "Nescau", ao invés de achocolatado; "evangelho", ao invés de mensagem. Os ensinos de Paulo eram tão recheados com o evangelho que ele resolveu dizer "o meu evangelho" ao invés de "o meu ensino". Outro fator que contribuiu para o apóstolo fazer esse tipo de associação seria o destinatário desta carta. Timóteo sempre esteve perto de Paulo, desde a segunda viagem missionária (At 16:1). Na verdade, ele foi fruto do ministério pessoal do apóstolo Paulo (I Tm 1:2) e, provavelmente, tudo o que Timóteo sabia sobre o evangelho veio da boca dele. Não seria estranho, então, Paulo se referir ao ensino dado a Timóteo como propriamente seu, afinal de contas foi Paulo que o ensinou todas as coisas. Estamos falando de uma carta pessoal, onde o interesse de Paulo era, tanto exortá-lo, como [nesse caso] lembrá-lo daquilo que lhe havia sido ensinado.

Mas gostaria de ir um pouco mais afundo nesse texto. Paulo nos mostrou, com suas palavras, uma atitude que todo cristão deveria ter para com o evangelho. Primeiramente, Paulo não usou a expressão com uma conotação de posse exclusiva, como se o evangelho pertencesse a ele. Segundo, ele não está dizendo que o evangelho tem origem nos seus ensinos, como se partisse dele.Vemos vários texto fazendo referência ao verdadeiro dono e autor do evangelho: Jesus Cristo (Rm 1:1,9; I Co 9:12; Fp 1:27). Acredito que o tratamento de Paulo para com o evangelho evidenciava uma profunda identificação com sua mensagem! É semelhante a um torcedor de um time de futebol. A identificação é tão grande que nem é preciso ser fanático para dizer "meu time". Paulo tinha uma enorme identificação com a mensagem do evangelho e isso criou nele um desejo de lutar com todas as forças para que sua mensagem não fosse deturpada, ou para que a sua abrangência não fosse reduzida. Nem mesmo o sofrimento era capaz de frear o apóstolo Paulo. Nem mesmo cadeias (II Tm 1:9)! Na época em que escreveu essa carta, já existiam muitos falsos cristão que perturbavam a igreja e queriam destruir a imagem do evangelho. Paulo, então, mostra um cuidado e carinho para com o evangelho ao mencioná-lo como algo íntimo e pessoal.

Fico muito triste ao ver pessoas sujando e pervertendo o evangelho, tão amorosamente batalhado e defendido pelos santos durante o primeiro século do cristianismo. É triste ver na televisão o que denominações evangélicas têm feito em nome do evangelho. Ver o que a sociedade ímpia tem feito contra as escrituras. Não quero deixar o MEU evangelho nas mãos dos que o usam como pretexto para ganhar dinheiro! Não deixe o SEU evangelho ser completamente ridicularizado por aqueles que permanecem descrentes à voz de Deus. Que possamos ter a atitude do apóstolo Paulo, pois esse é o NOSSO evangelho!