quinta-feira, 12 de maio de 2016

A Crise Política Brasileira e a Importância da Hermenêutica

     O cenário político do nosso país é realmente lamentável. O partidarismo tem tornado os processos políticos de importância nacional em meras partidas de futebol, ou algo do tipo. O processo de impeachment - que tem ganhado proporções internacionais quanto à imprensa - está dentro dessa situação. Por um lado, os governistas defendem veementemente a presidente, sustentando o conceito de que esse processo é um Golpe de Estado. Por outro lado, a oposição não mede esforços (até mesmo [pasmem!] vão para as reuniões da câmara) para agir ativamente contra a permanência da presidente. Um grande entrave político-partidário.
     Ambos apresentam argumentos fortes para sustentar as suas decisões.Entretanto, a pergunta mais lógica sobre esse problema parece estar inaudível: "Afinal de contas, quem está certo?". Como todo processo normal, espera-se que alguém esteja com a razão. Mas, após passado tanto tempo, por que não temos essa resposta?
     Minha intenção não é discutir sobre a política brasileira - até porque não tenho subsídios intelectuais para tal. Mas essa situação me fez pensar sobre a importância de uma ciência pouco conhecida: a hermenêutica. Pelo o que eu entendi acerca da situação do nosso país, a grande discussão sobre o impeachment é um problema hermenêutico. Deixe-me explicar: o cerne do processo de impeachment são as chamadas "pedaladas fiscais" que, de acordo com os juristas, caracterizam um crime de responsabilidade fiscal. Segundo o G1 (portal de notícias da rede Globo), a acusação contra a presidente está baseada no seguinte argumento:
"A prática se deu 'a partir de adiantamentos realizados pela Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil em diversos programas federais de responsabilidade do Governo Federal'. Como são controladas pela própria União, elas são impedidas por lei de emprestar ao governo. 'Essa conduta revela que os princípios inspiradores de Maquiavel estão presentes no governo federal, na medida em que os fins justificaram os meios, pois o objetivo único e exclusivo das pedaladas foi, e ainda é, forjar uma situação fiscal do país que inexiste, sem o temor de afrontar a lei para chegar ao resultado esperado'".
     Em contra partida, a defesa da presidente externa os seguintes argumentos (extraídos da G1 e BBC, respectivamente):
"Os pagamentos de subvenções econômicas não configuram operação de crédito e que as dívidas decorrem de mero acúmulo de saldos devidos".
"Os decretos de abertura de crédito sem autorização do Congresso – citados na denúncia de‪ ‎impeachment – não elevaram os gastos do governo, apenas remanejaram despesas já autorizadas pelo Legislativo na Lei de Orçamento. (...) O governador paulista Geraldo Alckmin (PSDB) também usou decretos de suplementação orçamentária; 'Deve sofrer impeachment? Não, porque são legais'".
     Além dessas citações apresentadas, têm-se as defesas que foram realizadas no Senado Federal por especialistas, onde todos os argumentos aparentemente tinham validade jurídica. Esse embate, que cada vez mais nos deixam duvidosos acerca do desfecho dessa situação, é uma questão puramente interpretativa. Uns veem ilegalidade do governo e outros não, ambos baseados em documentos legais que regulamentam a atividade política no Brasil. 
     Onde quero chegar com tudo isso? Ora, se a hermenêutica (ciência e arte da interpretação) - dentro das divergências produzidas por aqueles que a utilizam - é capaz de abalar o sistema político de um país, que dirá de seu uso para formalizar as doutrinas bíblicas? Em outras palavras, se hermenêutica é grande o suficiente para tornar-se fundamental nas decisões políticas de um país, quanto maior é a sua importância no que diz respeito ao estudo das Escrituras Sagradas!
     Não quero desprezar os documentos legais de nosso país, mas todos concordam (pelo menos a cristandade) que a Bíblia é o documento mais importante desse mundo. A Bíblia tem qualidade divina, pois foi produzida pelo próprio Deus através de homens movidos pelo Espírito Santo (2 Pe 1.21). Ela é a palavra de Deus registrada por escrito. Sendo assim, a única forma de entendermos as verdades nela contida é interpretando-a. Isso faz da hermenêutica uma das ciências mais importantes da teologia bíblica.
     Entretanto, há uma grande advertência. Assim como política brasileira foi atacada por divergências interpretativas, também a Bíblia está passível de desvios hermenêuticos. Isso pode ser visto claramente tanto ao longo da história da igreja quanto na situação contemporânea. Várias denominações que baseiam suas doutrinas em interpretações erradas das Escrituras são expostas à práticas que são completamente desaprovadas por Deus. Um versículo mal interpretado pode mudar completamente o comportamento de um indivíduo. O Dr. Zuck disse que interpretar a Bíblia sem o devido cuidado "pode gerar confusão e interpretações que se encontram até em inequívoco desacordo" (1994). O objetivo da interpretação nunca deve ser adicionar um significado ao texto, buscando a compreensão daquilo que lhe agrada, mas retirar informações do texto sem adulterá-las. Eis uma grande responsabilidade!
     Nós, que estudamos a Bíblia, devemos estar atentos. A situação do Brasil nos fez despertar, pelo menos, para uma coisa: precisamos interpretar com cuidado a palavra de Deus. Se a hermenêutica pode decidir a permanência de um presidente da República, muito mais esta ciência pode nos colocar em uma posição de aprovação ou reprovação diante de Deus!

REFERÊNCIAS
Ver http://g1.globo.com/politica/processo-de-impeachment-de-dilma/noticia/2016/04/o-que-dizem-parecer-defesa-e-pedido-sobre-impeachment-de-dilma.html
Ver http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2016/04/160402_defesa_dilma_ms_rb
ZUCK, R.B. A Interpretação Bíblica: meios de descobrir a verdade da Bíblia. São Paulo: Vida Nova, 1994, p.11.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

A Bíblia Proíbe o Juramento?

Resumo:
O veredito acerca do estudo sobre os juramentos não é consenso entre os estudiosos. Enquanto alguns sustentam a proibição definitiva desta prática nos dias atuais, outros entendem que o ato em si não é pecaminoso e pode ser observado pela igreja cristã, em algumas eventualidades. Este trabalho visa fornecer uma resposta bíblica a essa questão, buscando as evidências ao longo das Escrituras (Velho e Novo Testamentos) e culminando com o ensino de Cristo sobre o assunto, no texto de Mt 5.33-37.

Palavras-chave: Juramentos, Jesus, Proibição, Igreja.
 
CLIQUE AQUI para ler o artigo completo.
 
 

sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Razões para NÃO Adorar Maria

     Muitos que se dizem cristãos, ao serem questionados acerca da(s) personalidade(s) a quem eles cultuam,
insistem em reforçar as suas convicções monoteístas respondendo que dedicam sua adoração ao único Deus verdadeiro. Isso seria louvável, se realmente fosse observado na prática. O problema é que muitos incluem outras figuras como objetos de adoração em seus corações. Seja esse objeto tangível ou intangível, o fato de depositar a confiança e o louvor em qualquer outra coisa além do Deus trino é algo que fere o princípio da exclusividade da adoração ao Senhor (Êx 20.3). Muitos protestantes, pensando estarem inertes a esse problema, acabam criando ídolos invisíveis em seus próprios corações quando ocupam com outras coisas o lugar que deveria ser do Senhor.
     Entretanto, mesmo reconhecendo a grande importância desse assunto como exortação para os evangélicos, o alvo deste artigo é discorrer sobre esse problema dentro da esfera do Catolicismo. Nesse caso, a substituição da pessoa de Deus é ainda mais evidente (pelo menos, no meu ponto de vista). Os fiéis acabam recorrendo a uma infinidade de "santos" ou divindades a fim de dedicarem suas preces e derramarem sobre eles seus louvores. Quando são questionados sobre esse comportamento, eles se defendem, dizendo que não adoram a tais pessoas, simplesmente admiram a personalidade e os reconhecem como mediadores de suas causas diante de Deus. E, de forma ainda mais acentuada, Maria, a mãe de Jesus, torna-se o alvo principal dos louvores idólatras entre os católicos. E é justamente sobre ela que dedicaremos esse espaço.
     Sendo assim, o objetivo deste artigo é mostrar algumas razões pelas quais não devemos adorar a Maria (e nenhuma outra pessoa), mesmo considerando a sua importância para o cristianismo em sua origem. Além disso, outras questões serão comentadas, como a insistência dos católicos nessa prática (basicamente, o item 1 deste artigo) e quais as suas implicações teológicas.

1) Razões Históricas

     O louvor a Maria não foi sempre presente na igreja. Na verdade, não há nenhum registro entre os primeiros cristãos de qualquer tipo de veneração à mãe do Senhor Jesus (Tenney, 2008, vol. 4). Entre os escritos dos pais da igreja, há muitos elogios e apreciações à pessoa de Maria como a mulher que carregou o Salvador do mundo, mas nenhum deles a enfatiza de tal modo a torná-la digna de adoração (Rocha, 2005). Isso só veio a existir a partir do século IV, no Concílio de Éfeso. Nesse Concílio, Maria foi declarada a "Mãe de Deus", lhe atribuindo uma responsabilidade ímpar na formação do caráter divino de Jesus (Timm, 2003). Além disso, outros pensamentos posteriores, como a virgindade perpétua, a imaculada concepção e a assunção física foram cruciais para a dogmatização do culto a Maria pela igreja Católica.
     Isso nos faz pensar o seguinte: se Maria deve realmente ser venerada, é concebível o fato de que por aproximadamente 400 anos a igreja do Senhor tenha evitado esse tipo de prática?
Isso nos leva à segunda razão.

2) Razões Bíblicas

     É completamente compreensível que os primeiros cristãos nunca tivessem demonstrado nenhum tipo de veneração a Maria, pois não há nem sequer UMA instrução em toda a Bíblia que os levassem a esse tipo de prática. É possível ver algumas saudações e bem-aventuranças dirigidas à sua pessoa (ver Lc 1.28,42,48), mas isso não deve ser entendido como uma prescrição litúrgica ou uma ordem para adoração. O evangelista Lucas apenas estava descrevendo esses acontecimentos, e não os recomendando para a igreja. Segundo Tenney (2008, vol. 4), "essas passagens enfatizam o privilégio elevado e único, concedido a esta jovem especialmente escolhida, mas de forma alguma sugerem que adoração devia ser-lhe oferecida, a qual pertence somente a Deus".
     Será que algo que não é instruído pela Bíblia, mas unicamente através de concílios e tradições humanas, merece a nossa atenção como adoradores?

3) Razões Cristológicas

O Senhor Jesus, quando interrompido em um de seus sermões, disse o seguinte a respeito de sua própria mãe:
"Ora, aconteceu que, ao dizer Jesus essas palavras, uma mulher, que estava entre a multidão, exclamou: Bem-aventurada aquela que te concebeu e os seios que te amamentaram! Ele, porém, respondeu: Antes, bem-aventurados são os que ouvem a palavra de Deus e a guardam!"  (Lucas 11.27,28.)
     A grande oportunidade que Cristo tinha para recomendar a todos os seus seguidores que venerassem Maria era justamente nesse momento, entretanto, ele não o fez. Ele também não depreciou a imagem de sua mãe, mas apenas a colocou no mesmo patamar de todos aqueles que desejavam viver de acordo com a palavra de Deus. A atitude de Jesus deve, no mínimo, nos impedir de agir como aquela mulher que o interrompeu.
     Outra atribuição dada a Maria que subestima a ação de Cristo na vida dos salvos é a de intercessão. A atitude de Maria no milagre de Caná da Galileia (Jo 2.5) é o principal argumento a favor da ação intercessória de Maria na vida dos fiéis. Essa doutrina, porém, vai de encontro com a atribuição singular de Cristo como o nosso intercessor diante de Deus (Jo 17.20; 1 Tm 2.5; Rm 8.34). Não há nenhuma passagem bíblica que mostra Maria como a intercessora dos homens. Sendo assim, quando esse atributo é conferido a ela, os teólogos acabam depreciando uma responsabilidade cristológica.

4) Razões Pessoais

     A própria Maria não tomou para si a glória de carregar o Salvador do mundo. Após receber a notícia do anjo de que havia concebido, ela louva ao Senhor pelos Seus feitos e diz:
"A minha alma engrandece ao Senhor, e o meu coração se alegrou em Deus, meu SALVADOR." (Lucas 1:46,47)
     Somente alguém que está perdido em seus pecados assume a necessidade de um salvador. E Maria assim o fez. Ela acreditava que Deus não somente providenciou a salvação para o restante do mundo, mas também para ela própria. O fato de ela reconhecer a sua inferioridade é motivo para não dedicarmos nossa atenção a sua pessoa.

CONCLUSÃO

     Aqui estão algumas razões para não dedicarmos qualquer tipo de veneração a pessoa de Maria. Não estou afirmando que ela foi uma pessoa diabólica e deve ser desprezada no meio cristão. De forma nenhuma! Maria foi uma mulher privilegiada por carregar e cuidar do Messias que havia sido prometido desde o início da humanidade. Ela é bem-aventurada entre as mulheres porque nenhuma teve a oportunidade de preparar a vinda do Salvador a este mundo. Foi uma mulher piedosa e temente a Deus, seguindo sempre os passos de seu filho Jesus, mesmo após a sua morte e ressurreição (At 1.14). Creio que hoje ela está desfrutando da comunhão com Cristo nos céus, não porque ela foi assunta ainda estando viva, mas porque morreu crendo no Filho de Deus! Cristo foi o meio pelo qual ela chegou a Deus, assim como ele é também o nosso (Jo 14:6)! Sendo assim, não devemos adorá-LA, e sim, adorá-LO (o Deus Filho)!

REFERÊNCIAS
TENNEY, M. Enciclopédia da Bíblia. São Paulo: Cultura Cristã, 2008, vol. 4.
TIMM, A.R. Veneração de Maria: Como surgiu o dogma Católico da veneração de Maria. Revista Sinais dos Tempos, 2003.
ROCHA, J.M. O culto a Maria: uma criação do papado. Revista Parousia, 2005.



terça-feira, 28 de julho de 2015

Níveis da Graça?

     No âmbito cristão, é difícil algum fiel declarar que nunca ouviu falar acerca da graça de Deus. É
improvável que alguém que experimentou a salvação pela fé em Cristo não tenha condições de descrever - por mais simples que seja essa descrição - a doutrina da graça. Isso porque a graça está intimamente ligada aos ensinos concernentes à salvação e, assim sendo, alguém que já aceitou o dom da nova vida oferecido por Jesus Cristo deve, logicamente, compreender a graça de Deus.
     Embora nosso conhecimento sobre a graça esteja em um patamar satisfatório, nunca é demais buscarmos conhecê-la com mais afinco através da nossa fonte inesgotável de conhecimento teológico: a Palavra de Deus. E por inesgotável, entende-se que, por maior que seja o nosso esforço em retirar o máximo possível de conhecimento acerca de um determinado assunto, nunca iremos esgotá-lo por completo. É com esse sentimento que devemos buscar as respostas na Bíblia às nossas perguntas.
     E por falar em perguntas, aí vão elas! Nesse ensejo, pretendo responder a pergunta que deu título a este artigo: "Existem níveis de graça, ou a graça é sempre a mesma em todos os sentidos?". Obviamente, para responder essa pergunta, devo responder algumas outras, como: "A graça de Deus está somente ligada à salvação?"; "Somente os justos usufruem da graça?", e assim por diante.

A Graça em um contexto diferente da salvação

  A graça não é um favor de Deus que recai somente aos justos. Ou seja, a salvação não é o meio exclusivo pelo qual um indivíduo pode usufruir da graça de Deus. Para isso, vamos ao conceito mais básico de "graça": favor e bondade de Deus dado ao pecador imerecido. Apesar do termo "graça" está praticamente associado a obra de Cristo, ele não se restringe unicamente a isso [1].
     Por exemplo, se caminharmos para o início da história da humanidade, vemos Adão desobedecendo as ordens de Deus. Essa desobediência o traria consequências terríveis, como a morte ("certamente morrerás", Gn 2.17). Essa morte, além de significar separação de Deus, tem implicações físicas, indicando que o homem perderia sua imortalidade. Deus o havia criado de forma perfeita, mas o pecado revestiu seu corpo de corruptibilidade. Interessante que Deus poderia ter tirado a vida de Adão, merecidamente e coerentemente, no instante que ele pecou, mas Ele não o fez. O fato de Deus ter preservado sua vida foi uma demonstração de graça (favor sem merecimento). Talvez essa tenha sido a primeira manifestação da graça de Deus ao homem, antes mesmo de anunciar salvação através do Redentor (Gn 3.15)!

A Graça sobre Justos e Injustos

         Observe o texto em Mt 5.45:
"(...) porque ele faz nascer o sol sobre maus e bons e vir chuvas sobre justos e injustos." Mateus 5.45
O favor de Deus não está somente sobre os seus filhos, mas sobre toda a Sua criação. Deus dá a possibilidade de que todos vivam bem nessa Terra, não baseado no merecimento humano. Óbvio que isso não implica que a salvação repousa sobre todos, pois essa conclusão seria incoerente com vários outros textos que a Bíblia fornece. Esse favor de Deus é algo que beneficia a todos os homens, embora não os leve a salvação [2]. Os teólogos chamam esse favor de Deus de "graça comum", diferenciando-o da "graça especial" (meio pelo qual Deus salva os pecadores). Enquanto a graça comum engloba toda a humanidade, a graça especial alcança apenas uma parte dela.
     Ainda sobre a graça, não como referência a salvação, mas como uma ação de Deus sobre os injustos, ver o artigo A Graça de Deus sobre a Perversão.

A Graça e os Dons Espirituais

     Falamos inicialmente sobre a dissociação entre graça e salvação em um contexto onde Deus abençoa tanto os justos como os injustos.Veremos, mais uma vez, alguns textos bíblicos que evidenciam a graça de Deus em um contexto "não-soteriológico", embora eles encontrem aplicações diretas em situações eclesiásticas. Eu estou falando na graça de Deus em conceder dons espirituais a Seu povo.
     Por mais que a habilidade de um indivíduo pareça ser algo que dependa exclusivamente de seu próprio esforço, isso, na verdade, provém de Deus. E, se é algo que é dado por Deus, sem mérito humano, então é graça. Moisés deixou claro isso quando registrou as palavras de Deus:
"Eis que chamei pelo nome a Bezalel, filho de Uri, filho de Hur, da tribo de Judá, e o enchi do Espírito de Deus, de habilidade, de inteligência e de conhecimento, em todo artifício" Êxodo 31.2,3
O próprio Deus deu capacidade a Bezalel para desempenhar atividades que resultariam na construção do tabernáculo, o local de culto ao Senhor. Esse texto nos ensina que o Espírito Santo é o meio pelo qual Deus aplica sua graça na capacitação de obreiros para edificação da Sua obra. É óbvio que essa verdade não corrobora com o comodismo, excluindo a necessidade de dedicar tempo para aperfeiçoar nossas habilidades. A soberania de Deus deve está associada à responsabilidade humana.
     Iniciando uma seção sobre dons espirituais, Paulo diz o seguinte:
"E a graça foi concedida a cada um de nós segundo a proporção do dom de Cristo."  Efésios 4:7
O apóstolo também é testemunha de que os dons que foram confiados aos crentes são fruto da graça de Deus. Em outro texto, ele também atribui sua eficiência na obra de Deus como resultado da graça em sua vida (I Co 15.10).

A Graça e os seus Níveis

     Eis o motivo de nossa conversa! Creio que as linhas acima esclareceram algumas questões sobre a graça. O fato de Deus estender sua bondade até mesmo sobre aqueles que não O louvam é um sinal de Sua graça sobre eles. A diversidade dos dons espirituais presentes na igreja do Senhor também é sinal de Sua graça. "Como estas questões contribuem para a nossa compreensão sobre os níveis de graça?". Simples: o fato de vermos diferentes níveis de habilidades na igreja, ou diferentes níveis de prosperidade entre os incrédulos, são provas de que Deus não distribui sua graça da mesma forma a todos. Inclusive, Paulo nos diz que existem dons mais nobres do que outros (I Co 14.5), mostrando assim que Deus torna mais evidente Sua graça quando concede esses dons especiais aos seus filhos. "Mas qual seria o critério de Deus?". Sua soberania. Deus escolhe quem e como Ele quer abençoar. "Terei misericórdia de quem me aprouver ter misericórdia e compadecer-me-ei de quem me aprouver ter compaixão" (Rm 9.15). A soberania é o que move Deus em Suas decisões. Nesse sentido, é necessário dizer que existem níveis de graça.
     Até agora falamos em graça em um contexto "não-salvífico". "Mas no que é concernente a salvação, podemos dizer que Deus distribuiu Sua graça em níveis diferentes?". Difícil responder essa pergunta. Mas creio que a graça para salvação é comum a todos os salvos, por mais que aparentemente ela seja distinta. Deixe-me explicar: imagine que dois homens aceitaram a Cristo, onde um deles era bom (moralmente falando) e o outro era um assassino terrível. Qual deles recebeu maior favor de Deus? Parece lógico responder que foi o segundo, não é? Porém, se entendermos que ambos estavam igualmente perdidos e condenados, é fácil concluir que os dois receberam a mesma coisa.
     Paulo diz que a graça torna-se mais abundante em meio ao pecado (Rm 5.20). Entretanto, isso não implica dizer que a graça assume tamanhos diferente em cada pessoa, dependendo do pecado de cada um. Gosto da ilustração do pai que tinha dois filhos, onde um deles era mal e o outro não era tão mal assim. O pai, então, decide presenteá-los, dando uma bola de futebol para cada um. Note que, apesar de o presente ter sido o mesmo, o favor do pai torna-se mais aparente, em uma perspectiva exterior, por aquele filho rebelde. Creio que Deus nos dá o mesmo presente da salvação, apesar de ser mais aparente a uns do que a outros.

Sendo assim, é razoável entendermos que a graça é dada em níveis diferentes, em questões "não-soteriológicas", mas torna-se única quando o assunto é salvação.


[1] TENNEY, M. Enciclopédia da Bíblia. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2008. Volume 2.
[2] CHAMPLIN, N. Enciclopédia de Teologia e Filosofia.
[3] http://www.biblestudy.org/maturart/levels-of-grace.html

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

O Livro da Vida

Muito já se ouviu falar sobre o Livro da Vida, mencionado por diversas vezes no livro de Apocalipse. Entretanto, a sua definição tem dividido muitas denominações cristãs, principalmente pelo fato ser algo que interfere no pensamento sobre a soteriologia (o estudo da salvação). Dessa forma é importante entendermos, baseado nas evidências bíblicas, qual o significado real deste Livro e quais as implicações para a vida humana, em se tratando de está ou não inscrito nele. Queremos responder perguntas como: "Por que é importante compreendermos o propósito deste Livro?", "Algum nome pode ser apagado deste livro?", "Quando este Livro começou a existir?", etc.

Antes de tudo é importante deixar claro que o Livro da Vida não é uma referência a Bíblia, como alguns pensam. É óbvio que a Palavra de Deus testifica a respeito da vida e ela mesma contém as palavras de vida eterna (Jo 6:68), mas não podemos fazer uma referência imediata a Palavra de Deus quando encontramos versículos a respeito do Livro da Vida. Mais a frente vamos entender o porquê.

O grande interesse em se estudar acerca do Livro da Vida é porque a Bíblia nos mostra que ele será um instrumento para o julgamento final dos pecadores.  
"Vi também os mortos, os grandes e os pequenos, postos em pé diante do trono. Então, se abriram livros. Ainda outro livro, o Livro da Vida, foi aberto. E os mortos foram julgados, segundo as suas obras, conforme o que se achava escrito nos livros" Ap 20:12. 
Esse evento é conhecido como "o grande trono branco" (Ap 20:11), onde aqueles que foram mortos sem Cristo serão julgados e condenados diante de Deus. É interessante que eles já estão condenados (Jo 3:18), mas irão passar por um julgamento para que eles mesmos reconheçam que não merecem o perdão de Deus por terem negado, enquanto em vida, o sacrifício de Cristo. Dessa forma, o Livro da Vida será um dos critérios que evidenciarão a condenação deles.  
"E, se alguém não foi achado inscrito no Livro da Vida, esse foi lançado para dentro do lago de fogo" (Ap 20:15). 
O "lago de fogo" é o lugar de tormento eterno, onde Satanás e todos os que estão sem Cristo irão sofrer eternamente. Muitos pensam que o Diabo será o governador do submundo, mas ele já está condenado a ser atormentado pelos séculos dos séculos no lago de fogo (Ap 20:10). Por isso, é importante ter o nome escrito no Livro da Vida, pois a ausência nele implica em uma condenação e separação eterna diante de Deus. Então, é completamente relevante a compreensão da verdade sobre esse Livro, pois as implicações acerca da doutrina da salvação estão completamente relacionadas. Dessa forma, é importante fazer a seguinte pergunta:  Mas quais são as pessoas que possuem seu nome nesse Livro?

Era muito comum em culturas antigas - assim como em Israel - existir um registro de todos os cidadãos daquele local. Isso era uma prova de cidadania. Entretanto, esses nomes poderiam ser apagados por situações adversas, como morte, por exemplo. A Bíblia nos mostra que Deus faz de forma semelhante com os "cidadãos celestiais". O Livro da Vida registra todos aqueles que habitarão juntamente com o Senhor no paraíso. O Velho Testamento já mostra alguns indícios acerca desse Livro:
"Agora, pois, perdoa-lhe o pecado; ou, se não, risca-me, peço-te, do livro que escreveste" (Êx 32:32).
 Neste trecho, Israel havia pecado contra Deus, construindo para si um bezerro de ouro com a intenção de adorá-lo, e Moisés intervém em favor do seu povo para que Deus lhes perdoasse esse pecado. E nesta ocasião, Moisés roga a Deus que, caso o pecado de Israel fosse imperdoável, o seu nome fosse retirado do "livro que escreveste" (uma referência ao Livro da Vida, creio). Observe, a seguir, outro versículo:

"Sejam riscados do Livro dos Vivos e não tenham registro com os justo" (Sl 69:28). 
Neste Salmo, Davi pede a morte de seus inimigos, pedindo a Deus que os retire do Livro dos Vivos (mais uma referência ao Livro da Vida). Dessa forma, podemos aprender algumas coisas: (1) Deus é a única pessoa que pode escrever nesse Livro; (2) os nomes que nele estão contidos podem ser riscados; e (3) aparentemente, todas as pessoas que estão vivas possuem seus nomes inscritos, sendo a morte física um meio de riscá-lo. É dessa forma que o VT apresenta o Livro da Vida. Então quer dizer que somente as pessoas que se encontrarem vivas - ou seja, que possuem seus nomes no Livro da Vida - no dia do juízo é que escaparão da condenação eterna? Não existe nenhum meio de ter o nome gravado permanentemente, mesmo após a morte?

O Novo Testamento apresenta uma visão um pouco mais restrita acerca desse Livro. Todas as vezes que a expressão aparece é em Apocalipse, exceto em Fp 4:3:  
"A ti, fiel companheiro de jugo, também peço que as auxilies, pois juntas também se esforçaram comigo no evangelho, também com Clemente e todos os demais cooperadores meus, cujos nomes se encontram no Livro da Vida". 
Aqui o apóstolo Paulo se refere a pessoas que trabalhavam fielmente na obra de Deus. Seria um tanto inusitado se o apóstolo tivesse usado a expressão "Livro da Vida" apenas para enfatizar que esses cooperadores ainda estavam vivos naquele tempo. Talvez fosse mais óbvio justificar o uso da expressão para deixar claro que essas pessoas eram crentes, salvas em Cristo Jesus. Se esse texto não deixa claro a relação entre ser salvo e ter o nome gravado no Livro da Vida, observe os textos a seguir:  
"O vencedor será vestido de vestiduras brancas, e de modo nenhum apagarei o seu nome do Livro da Vida" Ap 3:5 
"E aqueles que habitam sobre a terra, cujos nomes não foram escritos no Livro da Vida desde a fundação do mundo, se admirarão vendo a besta que era e não é, mas aparecerá" Ap 17:8
  No primeiro verso, o Senhor Jesus mostra ao apóstolo João uma forma de ter o nome escrito permanentemente no Livro, que é vencendo através de Cristo (Rm 8:37). Aqueles que estão em Cristo não podem ter seus nomes riscados, nem mesmo através da morte! Isso porque, de acordo com o segundo versículo, os nomes dos eleitos do Senhor foram escritos antes da fundação do mundo! Antes de ter vida, o nome dos salvos já estavam escritos no Livro da Vida e, dessa forma, não podem ser apagados! Muitas pessoas que se dizem salvas creem que o pecado é capaz de riscar o nome delas do Livro e que serão condenadas se não apresentarem-se diante de Deus completamente imaculadas. Sabemos que o pecado sempre vai existir (I Jo 1:8) e o texto de Ap 3:5 nos dá a garantia de que estaremos livres da condenação eterna.

De acordo com os textos apresentados, podemos entender um pouco mais sobre o Livro da Vida. Em alguma hora, todas as pessoas irão morrer e terão seus nomes riscados deste Livro. A única forma de garantir a permanência nesse Livro é sendo um "vencedor" através do sacrifício perfeito de Cristo.

E você? Pode ter certeza que seu nome nunca será apagado?

sábado, 30 de agosto de 2014

Jesus Cristo: apenas um exemplo a ser seguido?

"Sede meus imitadores, como também eu sou de Cristo." I Coríntios 11:1
Paulo não está sendo orgulhoso - como alguns pensam - quando referiu essas palavras. Ele estava ensinando os irmãos de Corinto a manterem um comportamento cristão em meio a sociedade pagã e imoral em que viviam. Com certeza, quase que a totalidade deles nunca viram pessoalmente a Cristo e pouco ouviram acerca de seus ensinos. O apóstolo, de forma resumida e direta, exorta aqueles irmãos a terem como parâmetro de imitação a vida de Paulo, que obviamente foi um reflexo do que Cristo pregou e fez aqui na terra, além do fato de o terem conhecido pessoalmente. Mas será que Cristo é somente um bom exemplo, que vale a pena ser imitado? Será que ele simplesmente foi um homem com bons valores morais e sociais e que lutou, até a morte, para que seus princípios fossem praticados? Será que ele foi somente um pensador revolucionário que criou uma religião chamada cristianismo?

Paulo escreveu esse versículo em uma carta endereçada a uma igreja que havia na cidade de Corinto. O público alvo desta mensagem era pessoas que já professaram publicamente a fé em Cristo; que realmente criam nele como salvador de suas vidas. A essa altura da história (55 d.C.), as boas novas de Cristo já haviam sido espalhadas pelo mundo do primeiro século. Um dos meios pelo qual o mundo soube da vida de Jesus foi através do próprio apóstolo Paulo, em suas muitas viagens. Ele, inclusive, levou o evangelho para a cidade de Corinto. Uma das formas que o apóstolo encontrou de continuar ensinado, exortando e esclarecendo os assuntos referentes a vida cristã, foi por meio de cartas - que compõem boa parte do nosso Novo Testamento. E nesse caráter exortativo, o conteúdo da mensagem que essas cartas carregavam era a recomendação de um padrão de vida semelhante ao de Cristo (Ef 4:1; 5:1; 6:1-5; Fp 1:27; 2:5). Essa é a vontade de Deus: que seus filhos vivam como o seu Filho! Dessa forma, só há sentido em imitar Jesus para aqueles que realmente o tem como Salvador de suas vidas. Esse processo de imitação é chamado de santificação!

Entretanto, mesmo pessoas que não depositam inteiramente sua fé em Cristo reconhecem que ele foi um homem de caráter  e continua sendo um exemplo mundial para ser seguido. As suas atitudes e os seus ensinamentos devem ter um espaço na educação humana sobre ética e responsabilidade social. Ele sustentou as suas teses e, mesmo sofrendo pressão religiosa e política por parte dos judeus e do governo romano, não negou a sua personalidade, preferindo morrer do que ver sua ideologia morta. Seu pensamento movimentou uma multidão de pessoas que, acima de tudo, lutavam pelos direitos dos pobres e pela inclusão dos marginalizados. É assim que o mundo ver a Cristo. Será que "seguir o exemplo de Cristo" é a solução para a humanidade? Vou melhorar a minha pergunta: será que pessoas que não depositaram sua fé no sacrifício de Cristo podem ser transformadas somente por seguir o exemplo de Jesus? A ênfase para a salvação do pecador deve ser no sacrifício de Cristo ou em sua vida terrena como um revolucionário? Apesar de muito do que foi citado no início desse parágrafo ser verdadeiro, há um perigo mortal em confiar na restauração da humanidade sendo pragmático sobre o exemplo de Jesus.

Primeiro, não há como seguir os passos de Cristo se você não estiver em Cristo. Ou seja, só é possível imitar a Jesus se você o reconhece como o Salvador de sua vida. Veja o verso abaixo:
"Aquele que diz que permanece nele [em Cristo], esse deve andar assim como ele andou." I Jo 2:6
É nisto em que está baseado a salvação, segundo a Bíblia. O homem é transformado quando crê na morte substitucional e na ressurreição sobrenatural de Cristo. Deus não cobra que se atinja um patamar de bondade para que isso aconteça (Rm 4:5). Basta depositar sua fé completamente na pessoa de Jesus. É algo instantâneo, e não progressivo (At 16:31). Seguir os passos de Jesus seria uma consequência e uma evidência de que esse primeiro passo [de fé] já foi dado. Portanto, seguir o exemplo de Cristo, esquecendo-se de crê nele, é um caminho sem êxito diante de Deus.

Segundo, temos que entender o que significa conversão. A Bíblia nos diz que o salário do pecado é a morte (Rm 6:23), ou seja, quem peca contra Deus deve morrer para que a Sua justiça seja satisfeita. Dessa forma, o máximo que um viver "piedoso" - segundo os passos sofridos de Cristo - pode fazer é consertar a sua situação do presente e do futuro, mas seus pecado do passado estão em débito para com Deus. Você precisa pagá-los. "Sem derramamento de sangue não há remissão" (Hb 9:22). A grande beleza do evangelho é que Deus aceita um substituto para pagar pelos seus pecados. Foi assim que aconteceu com Israel, durante o regime da Lei. Deus providenciou os sacrifícios levíticos para que os pecados da nação fossem pagos. O israelita deveria levar um animal sem defeito para o altar, colocar sua mão sobre a cabeça dele (simbolizando a transferência da culpa pelo pecado) e o sacrificar, satisfazendo a justiça de Deus. A questão é que "o animal morria, mas não como um exemplo de como o pecador deve, em troca, sofrer pelos seus próprios pecados e, desse modo, encontrar perdão; ele morria como um substituto no lugar do pecador, para que o pecador não tivesse que sofrer ele próprio a pena do seu pecado e morrer" (LENNOX, 2014). Esses sacrifícios levíticos eram um símbolo do sacrifício perfeito que viria mais tarde na pessoa de Cristo. Da mesma forma, a morte de Jesus não representa um legado de sofrimento que cada um deve experimentar para conseguir de Deus o perdão, mas sim o perfeito sacrifício, onde todo que deposita inteiramente a sua fé nele, experimenta o perdão do Pai. E a realidade da situação é essa: "até que os homens e as mulheres sejam convertidos, eles não terão nem o poder nem a disposição de seguir o exemplo de sofrimento de Cristo" (LENNOX, 2014).

A diferença é minuciosa, mas é fatal. Enquanto você encarar Cristo como simplesmente um grande homem na história, o seu problema não está resolvido. Me entristeço quando vejo as pessoas enaltecendo Cristo dessa forma. Eles colocam Jesus no topo das personalidades mundiais, mas não fazem ideia do que ele realmente representa. Ele é a intervenção divina para a salvação do homem, e não um homem politicamente correto! Ele não somente morreu, mas ressuscitou!


LENNOX, John & GOODING, David. A Definição do Cristianismo. Editora A Verdade, Porto Alegre, 2014.